Definitivamente podemos chamar o novo filme da Disney de “Encanto”. Em meio a muita cor, beleza e muita música, o longa nos conta a história da família Madrigal, com o foco central na personagem Mirabel.
O filme, mesmo sendo narrado com leveza, já que é direcionado para o público infantil, retrata como as dinâmicas familiares podem ser complicadas, e como, além da aparência inicial, os Madrigal estão longe de ser uma família sem defeitos.
A princípio, parece a família perfeita: eles moram em uma casa mágica que deixa a nossa sem nenhuma graça. São influentes na cidade e todos integrantes têm um dom mágico que os torna, além de interessantes, úteis para toda comunidade e para o funcionamento da própria estrutura familiar. A trama, no entanto, gira em torno de Mirabel, a única Madrigal sem um dom especial aparente.
Cada integrante tem seu papel definido. Vamos conhecer alguns: a Abuela, matriarca da família, é quem sustenta a dinâmica da casa, sendo responsável por manter a magia de todos acesa, representada por uma vela no filme. Luísa, a irmã mais velha de Mirabel, tem o poder da força, podendo carregar pesos impensáveis para pessoas comuns, então é requisitada por todos da cidade para resolver problemas. Por outro lado, a outra irmã da protagonista, Isabel, tem o poder da beleza e da criação de flores, além de ser considerada o modelo de garota perfeita.
Sendo a única que não possui um dom especial, Mirabel se sente na obrigação de se esforçar ao máximo para suprir as expectativas da família, especialmente de sua avó, mas ainda assim não se sente aceita. Mesmo amada por seus pais, a personagem nos mostra a necessidade de ser “especial” para se sentir pertencente ao seu grupo de familiares.
Vale ressaltar que Mirabel é dedicada, gentil, bondosa e colabora com todos. Aparentemente suas diversas qualidades não bastam para a avó, que aguarda algo extraordinário de seus filhos e netos. O sentimento de inadequação da jovem não é infundado, pois é esperado dela algo que não pode oferecer, enquanto suas outras diversas qualidades são consideradas menos importantes.
Ao longo da trama, entendemos que mesmo os personagens com dons mágicos também carregam estigmas que podem lhes ser custosos. Luísa sente-se sobrecarregada com tanta demanda, e ainda assim não consegue negar os pedidos da comunidade por entender que esse é seu papel. A força dela pode ser compreendida de forma literal e também simbólica. A pessoa considerada “forte” é aquela que todos imaginam ser capaz de lidar com pressão e problemas. Trata-se da sobrecarga que suportamos no nosso dia a dia, nas demandas que muitas vezes precisam ser divididas, mas as enfrentamos sozinhos.
Já Isabela, a irmã “perfeita”, carrega o estigma de não poder errar, de ter que manter a aparência perfeita e seguir o plano que lhe desenharam, não importando que isso custe sua alegria. No momento em que se liberta desse papel, passa não só a produzir flores mas também espinhos, e sua roupa, que era inteira rosa, passa a ser colorida. Simbolicamente, entendemos que o ser humano é assim: produzimos ora rosas, ora espinhos. Ou seja, ninguém é perfeito o tempo todo, e estar aberto para novos caminhos e experiências traz muito mais alegria e cor às nossas vidas.
Ah, por aqui falamos do Bruno! Este personagem, apesar de ter um dom, é considerado inadequado pela família por não corresponder à representação de normalidade que os Madrigal esperam. Se com Mirabel podemos perceber que a rejeição por parte da Abuela ocorre de forma velada, com o tio de nossa protagonista isso ocorre de forma declarada por todos os seus familiares.
O dom de Bruno é ter visões sobre o futuro, e, quando ele anuncia as notícias que ninguém espera ou sequer quer conhecer, torna-se indesejado até o ponto de sentir que precisa se afastar de seus entes queridos para não os incomodar. Bruno é o personagem que aponta imperfeições e insucessos a que todo ser humano está sujeito, porém muitas vezes são negados por nós e nos causam conflitos quando confrontados.
Foi preciso que a casa dos Madrigal desmoronasse e todos perdessem seus poderes para que a dinâmica familiar deles pudesse ser reconstruída. É justamente quando perdem seus dons e deixam de cumprir as expectativas da comunidade que se abre a possibilidade de todos se reconectarem e se permitirem conhecer uns aos outros, sem a rigidez de conservação imposta pela Abuela.
Sem se relacionarem apenas apresentando os rótulos que seus poderes mágicos impõem, os Madrigal, agora juntos e como uma família imperfeita, reconstroem a casa que já não é mais mágica. Entendemos, assim, que uma família pode perfeitamente se estruturar quando acolhe não somente as qualidades, mas as imperfeições de cada integrante.
É quando isso ocorre que a magia volta a acontecer, e torna-se claro o dom, não mágico e mesmo assim não menos especial, de Mirabel: o de unir a família e despertar o melhor de todos.
Se você ainda não assistiu ao filme Encanto, a dica é que assista e, certamente…Encante-se! Se já viu, comenta aqui com a gente: o que achou? Você identifica padrões familiares no filme?