Blog

Os gênios da psicologia e nós psicólogos meros mortais

Os gênios da psicologia e nós psicólogos meros mortais

Freud, Skinner, Rogers, Bandura, Piaget, Vygotsky, Jung, quantas vezes esses nomes te fizeram sentir que você nunca será como esses grandes teóricos?

Você já pensou que eles são gênios que criaram sozinhos uma nova forma de ver a Psicologia e que estão muito distantes do que você seria capaz de fazer?

Quantas vezes essa mesma crença te fez se sentir incapaz de chegar aos pés deles?

Se você já se sentiu assim, isso não é exclusividade sua e saiba que isso pode até mesmo influenciar na sua forma de aprender a Psicologia.

Aprender sobre as falhas dos cientistas pode melhorar a aprendizagem

Normalmente, quando se ensina sobre uma Ciência nós acabamos falando também sobre os cientistas que fizeram as teorias ou descobertas.

Contudo, também é muito comum que ao falar sobre esses cientistas nós acabemos tendo a ideia de que eles foram gênios que fizeram grandes descobertas de modo muito fácil, sem enfatizar o seu lado humano e os problemas que eles enfrentaram até realizar suas descobertas.

Dessa forma, a visão que temos de cientistas geralmente está associada a pessoas muito inteligentes, diferentes do restante dos meros mortais. Quando na realidade eles são apenas pessoas como quaisquer outras, mas que tem como emprego descobrir coisas, produzir conhecimentos.

Assim, essa visão limitada de que cientistas são gênios influencia na forma como aprendemos sobre suas teorias.

Em uma pesquisa recente foi demonstrado que alunos do ensino médio podem melhorar suas notas em disciplinas de ciências e matemática ao aprender sobre as lutas pessoais, desafios e experimentos que deram errado de grandes cientistas, como Albert Einstein e Marie Curie.

Segundo o professor Xiaodong Lin-Siegler do Teachers College, da Universidade Columbia, que liderou a pesquisa:

“Quando as crianças simplesmente pensam que Einstein é um gênio, eles acreditam que nunca podem ser como ele”, disse Lin-Siegler. “Muitas crianças não sabem que todos os sucessos requerem uma longa jornada com muitas falhas ao longo do caminho”.

Até Einstein falhava: Como foi feito o estudo

No estudo realizado pela equipe de Lin-Siegler, 402 alunos do nono e do décimo ano de quatro escolas de Ensino Médio de Nova York em áreas de baixa renda do Bronx e Harlem foram divididos em três grupos.

  • O primeiro era um grupo de controle que leu textos de 800 palavras com descrições típicas de livros didáticos de ciência sobre as grandes conquistas de Einstein, Curie e Michael Faraday, um cientista inglês que realizou descobertas importantes sobre o eletromagnetismo.
  • O segundo grupo leu textos sobre os desafios pessoais desses cientistas, incluindo o vôo de Einstein da Alemanha nazista para evitar a perseguição como judeu.
  • O terceiro grupo de estudantes leu sobre os desafios intelectuais dos cientistas, como a persistência de Curie, apesar de uma série de experiências que falharam.

No final de um período de seis semanas, os alunos que leram sobre os desafios intelectuais ou pessoais dos cientistas eram mais propensos a dizer que os cientistas famosos eram pessoas como elas, que tinham de superar os obstáculos e a falta de sucesso.

Os estudantes que não leram sobre os desafios dos cientistas mais frequentemente acreditavam que os grandes cientistas tinham um talento inato e uma aptidão especial para a ciência que os separava de todos os outros.

O que aprendemos com isso?

Os resultados desse estudo nos mostram que além de incluir conteúdos enriquecidos, os livros didáticos de ciência devem destacar as lutas e desafios dos grandes cientistas em vez de simplesmente descrever seu sucesso e listar suas conquistas.

Os professores também podem usar exemplos baseados em histórias da vida dos cientistas em suas lições para motivar os alunos a aprender sobre ciência, particularmente ao ensinar tópicos científicos desafiadores.

Além disso, os professores que compartilham seus próprios desafios em aprender ciência com os alunos também podem motivá-las, segundo Lin-Siegler.

E a Psicologia?

Nós podemos aprender muito com essa pesquisa, já que a Psicologia também é uma ciência e muitas vezes os alunos sentem que os grandes teóricos como Freud, Skinner e Rogers criaram suas teoria porque eram gênios.

Embora, a pesquisa tenha sido feita com alunos do ensino médio, podemos generalizar esses resultados para os alunos do ensino superior também, que devem lidar com a aprendizagem de teorias cada vez mais complexas.

É muito comum ouvir queixas de alunos de psicologia de que eles têm que aprender muitas teorias, se lembrar de muitos teóricos e é muito difícil lidar com tudo isso.

Também é muito comum ver professores que ensinam sobre Psicologia justamente endeusando os teóricos. Ah foi !Freud que disse”, “É assim porque Skinner propôs isso no livro…”

Você já teve essa sensação de que os teóricos sabiam de tudo, não teve?

Mas, A verdade é que embora esses grandes teóricos sejam pessoas de grande importância para a Psicologia, eles não tinham super poderes e nem estavam acima de qualquer um de nós.

Todos eles enfrentaram dificuldades, pessoais, familiares e no trabalho, como qualquer outro mortal.

A realidade é que suas teorias não foram criadas de uma vez só e nem exatamente como você aprende hoje.

Cada teórico foi trabalhando por muitos anos, realizando muitas pesquisas, experiências e aprendendo com seus próprios erros. Tudo isso foi permitindo que eles pensassem e repensassem suas próprias ideias até chegar ao que conhecemos hoje.

Se considerarmos o Jean Piaget, por exemplo, podemos dizer que ele começou seus trabalho na década de 1920 e terminou em 1980 quando ele morreu. Só nesse período ele teve 60 anos de intenso trabalho e de reformulações. Um período cheio de erros e acertos, que geralmente resumimos em uma ou duas aulas na faculdade.

Por isso, seria interessante que quando você tiver dúvidas em aprender alguma teoria ou for ensinar alguma teoria para alguém tente se lembrar disso: os teóricos são seres humanos como todos os outros.

Lembre-se disso e tente entender como é que aquela pessoa foi chegando as conclusões que ela chegou. Assim, ficará mais claro para você o porquê as teorias são como elas são.

Desfazendo outro mito…

Ah, antes de encerrar quero te lembrar de outro mito que está ao redor desses grandes nomes: é a ideia de que eles são os gênios que construíram suas teorias do nada e sozinhos.

Isso absolutamente não é verdade! Em ciências as teorias são conjuntos de hipóteses que são testadas por meio de pesquisas, o que envolve a colaboração de várias pessoas sejam alunos ou outros pesquisadores.

O diálogo com outras pessoas em Ciências é constante, e com esses teóricos não foi diferente. Eles foram construindo suas teorias ao longo de anos e com a colaboração de várias pessoas.

Hoje temos a impressão de que tudo foi feito da noite para o dia, por uma única pessoa, sem reformulações e que tudo é pura verdade.

Não caia em armadilhas! Embora essas pessoas tenham tido um peso muito grande nas suas formulações teóricas eles sempre compartilharam o conhecimento e é por isso que foram crescendo e desenvolvendo mais suas teorias.

Além disso, não é porque algo está escrito que se torna uma verdade absoluta. Em ciências tudo é questionável, tudo pode ser revisto.

Quando fazemos uma pesquisa nós não provamos que estamos certos, nós só demonstramos que não estamos errados. Mas toda pesquisa tem limites também e é possível que outra pessoa prove que nossos resultados estavam equivocados e o que devemos fazer então? Analisar as novas evidências e mudar se necessário.

Os grandes teóricos em Psicologia morreram há muitos anos, Freud, por exemplo, morreu em 1939. O mundo mudou muito desde então. É importante pensar no hoje, no aqui e no agora.

O que fez com que os grandes teóricos fossem grandes foi o fato de eles reconhecerem que é preciso mudar e assim ao fazer suas pesquisas, eles avançaram e mudaram o que consideravam certo até então.

Por isso, não tente dizer que não se pode usar internet porque Freud falou ou Skinner diria. Eles morreram, precisamos pensar no hoje.

Não vamos jogar fora tudo o que fizeram, mas sim aproveitar o que eles ofereceram de bom e tentar entender como isso se aplica em nossa realidade atual. No que é igual e no que é diferente.

Enfim espero que este texto sirva para te mostrar que nós não estamos tão distante assim dos grandes gênios da psicologia e eles nem são tão diferentes do que nós.

O importante é sempre tentar se esforçar para melhorar, todos temos capacidade de fazer grandes coisas e então é preciso agir para tentar atingir e superar nossos.

Eles já fizeram muito, mas ainda há muita coisa por fazer, todos os dias existem coisas novas que precisam ser explicadas e entendidas.

Não é um autor que explica, mas sim o conjunto de vozes dos autores que formam a Psicologia que explica.

Se você gostou desse texto e acha que ele pode ajudar alguém compartilhe e deixe seus comentários com ideias, críticas e sugestões. Seria muito bom ouvir sua opinião.

Referências
  1. Xiaodong Lin-Siegler, Janet N. Ahn, Jondou Chen, Fu-Fen Anny Fang, Myra Luna-Lucero. Even Einstein struggled: Effects of learning about great scientists’ struggles on high school students’ motivation to learn science.. Journal of Educational Psychology, 2016; 108 (3): 314 DOI: 10.1037/edu0000092
  2. Columbia University, Teachers College. (2016, May 2). Even Einstein struggled: Learning about scientists’ failures can boost STEM grades. ScienceDaily. Retrieved July 27, 2017 from www.sciencedaily.com/releases/2016/05/160502084152.htm

Compartilhe

Inscrever-se
Notificar de
guest
0 Comentários
mais antigos
mais recentes
Feedbacks embutidos
Ver todos os comentários

Descubra mais

Veja outras postagens relacionadas

Inaugurando a seção de sugestões de leitura eu vou indicar um dos grandes clássicos da Psicanálise e também da Psicologia: “A interpretação do Sonhos”  de Sigmund Freud. No Livro “A

Esse artigo é uma adaptação do artigo “What the Pope’s resignation Tells Us about His Brain” do neuropsicólogo Dr. Ian Robertson da Trinity College Dublin. Considerando a importância e surpresa/fato

Vou começar sem direção. Quero a liberdade de escrever sem direção, sem uma ideia central, um mote qualquer que me limite em um caminho único. Quero a multiplicidade da polissemia

0
Adoraria saber sua opinião, comente.x